Garimpo (1989)

         
          Publicado pela editora Oficina (dos tradicionais Cadernos de Poesia) o livro é prefaciado pelo saudoso poeta e editor Francisco Igreja.
          Capa: Jorge Prado.


Segundo livro publicado por João Prado, possui alguns poemas já constantes em Pedaços de Sonho (atendendo a diversos pedidos). Ao lado de poemas longos e de versos livres, João mostra que também é capaz de composições de forma fixa, como sonetos e trovas.
AS MINHAS RAZÕES
Eu não preciso
de um motivo especial
para brindar,
eu brindo à Vida
Uma rosa,
uma roupa colorida
e o sal. . .
E as notícias fresquinhas
no jornal
na manhã que mal começa.
E a pressa
dos que anseiam conquistar.
E um pedaço de pão,
e uma canção
sucesso em quase todas
as paradas.
Uma estrela
diante dos meus olhos
brilhando.
E a madrugada rolando
e o sol madruguejando
nos telhados,
nas praças,
nas entranhas,
nas estranhas vielas,
nas favelas,
nos becos, nas janelas,
nos palácios de cristal.
E o cal
pintado à beira dos caminhos.
E os vinhos
com que brindo à própria vida.
E o riso e a alegria,
e a incontida energia
que gira os motores
que gela, que aquece
que engrandece,
que estremece de sons
a casa cheia.
O sangue em cada veia
que bombeia a esperança,
o riso de criança.
O dia lindo
eu brindo,
o beijo enfim dos namorados
eu brindo,
o par que vai
de braços dados.
Eu brindo o mar calmo
vez em quando feito a vida
e as ondas
vez em quando
feito a vida
bravejando.
Os frutos madurando
nos quintais.
Eu brindo
o leite fresco
nos currais.
Eu brindo
esta esperança germinando
nos olhos que ainda há pouco
soluçaram.
Eu brindo esta saudade ruminando
nos peitos que ainda há pouco
se entregaram.
Eu brindo o sabonete
e a água fria
que lavam meu rosto
a cada dia.
Eu brindo
esta camisa que me veste.
Eu brindo o cafezinho.
Eu brindo estes sapatos
que me calçam
defendendo meus pés
pelos caminhos.
Eu brindo a dor
que me burila,
que me lapida
e me torna humano.
Eu brindo o desengano
que me ensina a ser mais
de pés no chão.
Eu brindo o inverno,
o verão
pois há sempre uma razão
para brindar.
Eu brindo
o abraço de um amigo
pois não, há coisa melhor
que o peito
que se toma por abrigo
pra se dar.
Eu brindo a chuva
que lava minha cara.
Eu brindo a lua
que à noite se escancara
de luar.
Eu brindo o telefone
me buscando,
e a juventude
que encara as problemáticas cantando.
Eu brindo o tamborim
e a geografia,
e o giz,
eu brindo o dia
assim que ele começa.
Pois sei que é uma promessa
de festança.
Eu brindo essa esperança
no meu peito.
Eu brindo esse direito
de pensar.
Eu brindo esse pensar
de qualquer jeito.
Eu brindo!
Eu brindo as mãos que dão,
As mãos que ajudam.
Eu brindo as mãos
que mudam,
que constroem.
Eu brindo as mãos que moem,
que edificam.
Eu brindo as que suplicam
e as que ficam
sem cessar
estendidas,
incabidas
de razões para brindar.

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